A castração do CHEGA

 

 

 

 

 

A castração do Chega – Orígenes é um dos mais importantes pensadores do início da Igreja. A ele devemos muito do pensamento cristão do período patrístico. No entanto, para os estudantes de Teologia ele é e será sempre recordado jocosamente por se ter castrado, pensando que assim conseguiria resistir melhor às tentações carnais.

Levando ao exagero a filosofia platónica e tendo sido considerado herético no Concilio de Alexandria, convocado pelo Bispo Demétrio, ele via a seu órgão reprodutor como algo que é do Demónio e, logo, não é obra de Deus.

É certo que foi por ter sido herético que ele, ao contrário de outros pensadores cristãos desse período, não é santo, mas será sempre aquele que se castrou. Orígenes, para os estudantes de Teologia é um nome nunca esquecido por esse aspeto circunstancial e louco da sua vida. Outros tempos! Dirão…

O projecto do Chega

O projeto de revisão constitucional do Partido Chega, anunciado a 22 de setembro, que prevê a remoção dos órgãos reprodutores a criminosos condenados por violação de menores, a par da discussão na ultima convenção do partido Chega de uma moção (não aprovada), que propunha a retirada dos ovários às mulheres que tivessem recorrido ao aborto no Serviço Nacional de Saúde (SNS), fez-me recordar o episódio de Orígenes.

Mas o Chega é um partido político e a política não deve ser misturada com Fé! Dirão…

Teoricamente até é assim e, na prática, também o deveria ser. Mas não consigo ficar indiferente quando vejo inúmeros cristãos anónimos e alguns com espaço nas redes sociais, a defender as ideias do Chega, feitas à medida dos Orígenes deste tempo.

Não consigo deixar de ficar abismado e profundamente triste quando vejo que um partido como o Partido Pró Vida (PPV), que foi fundado com reconhecido fundamento cristão e por pessoas cristãs, se funde com o Chega, que defende todo o tipo de princípios xenófobos, potencializadores de divisões e diferenciações sociais pouco consentâneas com o que propõe o Evangelho e, sobretudo, pouco consentâneos com o mandamento do Amor e da Misericórdia, proposto por Jesus Cristo e por Ele aplicado em tantas situações (a mulher adúltera, o cobrador de impostos, o centurião romano……..)?

Também zarolhos, cegos…

Na minha opinião, se houve um cristão a defender estas medidas, vamos então começar a praticar à letra a passagem de Mc 9, 43-47 e andaremos todos zarolhos ou mesmo cegos, para além de manetas, já que pecamos mais com os olhos, mãos e língua (apesar de esta não vir referida na passagem bíblica, por ser uma mutilação não prevista na lei judaica), do que com os nosso aparelho reprodutor.

Quando tomamos posição política como cristãos, temos de nos recordar de que quem defende o aborto ou a eutanásia peca, mas que a mutilação também é um pecado grave em quaisquer circunstâncias.

Há que estar alerta e ter cuidado com os extremismos demagógicos que podem levar ao descrédito e ao ridículo todos nós, seguidores do Cristo misericordioso.

E como os tempos felizmente mudaram, já não temos o Bispo Demétrio para convocar concílios para avaliar a circunstância e a heresia. Temos, sim, um Papa que nos fala da beleza do amor em todas as suas dimensões e que nos guia no caminho daquilo que são as propostas do Evangelho e é esse o caminho que devemos seguir.

Padre Miguel Neto

Pároco de Tavira e director do setor da pastoral do turismo da diocese do Algarve, in www.ecclesia.pt


A castração do Chega