Porto vai negociar com Governo descentralização de competências

A Câmara Municipal do Porto cumpriu a ameaça e decidiu terça-feira a saída da ANMP em protesto pela desconsideração do Governo com a autarquia e a subserviência da direcção dos autarcas aos desígnios de Lisboa.

O presidente da Câmara lembrou que a “ANMP não fez nenhum esforço no sentido de um adiamento relativamente à educação que era lógico e recomendável e podia ter resolvido esta questão” e esclarecendo a sua centralidade sublinhou: Fui eleito pelas pessoas do Porto, não fui eleito por mais ninguém. Esse tipo de insulto eu considero que é uma medalha. Demonstra que estou a fazer o que devo fazer pelos munícipes do Porto.”

O enquadramento desta negociação foi relatado por www.porto.pt

Na educação não vamos poder alterar coisa nenhuma. Não há descentralização nenhuma na parte da educação. Somos tarefeiros. Gerimos o condomínio. Mas não entramos na casa propriamente dita”, prosseguiu o presidente da Câmara do Porto, resumindo: “Não quero que me venham outra vez dizer que estamos representados por uma associação que não nos protegeu. Encomendámos um estudo a uma entidade externa, a Universidade do Minho, para que fosse feita uma avaliação. O Município do Porto vai ficar com menos recursos para fazer aquilo que fazia.”

Um exemplo prático é o montante de 20 mil euros/ano por escola para manutenção e conservação do edificado que o Governo se propõe transferir para os municípios. A resposta do Ministério da Educação ao Supremo Tribunal Administrativo, no processo cautelar movido pelo Município do Porto, indica que a verba “resulta de acordo entre o Governo e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.”

“Não só não tínhamos mandatado a ANMP para o fazer, como tínhamos cuidadosamente dito em 2018 para não fazerem em nosso nome. Não passamos procuração nessa matéria. O facto de fazermos parte de uma associação não lhe dá poderes de representação que vincule o nosso município quando nós prevenimos que não nos conformávamos com isso”, contestou Rui Moreira, acrescentando: “A única coisa que dissemos à ANMP, que foi deliberado pelos órgãos da Câmara do Porto, foi que quando chegasse o ponto de negociarem, queríamos ser ouvidos. E não fomos. Fomos olimpicamente ignorados.”

Recuo eventual

A próxima assembleia municipal será a 30 de Maio e é vista como limite para as negociações finais; até lá fica a bola do lado da ANMP que tudo fará para “desentalar” o Governo com este aperto de Rui Moreira – um esclarecimento efectivo e claro do que é a descentralização, as funções de gestão e a avaliação do custo e respectivo pagamento das competências a assumir pelas autarquias.

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RN,  13 de Abril:    QUESTIONADA A AUTONOMIA DA ANMP

O alheamento da ANMP – Associação Nacional dos Municípios Portugueses – sobre as consequências das actuais delegações de competências pelo governo para as autarquias está a provocar reacções de muitos autarcas que se manifestam descontentes com o processo – contestam a falta de compromisso do executivo em fazer acompanhar as transferências de funções com o respectivo valor financeiro e consideram que o enquadramento das decisões os transforma em “tarefeiros” do poder de Lisboa.

A reacção mais clara e dura a esta situação foi protagonizada pelo independente Rui Moreira que acusou Luísa Salgueiro (presidente da ANMP e Câmara de Matosinhos” de “cumplicidade e total conivência” com o Governo no processo de descentralização.

Entretanto a distrital do Porto do PSD considerou em comunicado que “o processo de Descentralização deixou a descoberto as fragilidades estruturais da Associação Nacional de Municípios Portugueses, nomeadamente quanto à real defesa dos interesses dos municípios” e considera que “ainda agora o novo Conselho Diretivo da ANMP tomou posse e já está a reincidir nos erros do costume. Afirmar que “estamos a trabalhar com as várias pastas para que se introduzam alterações que vão ao encontro das reivindicações dos autarcas” é quase o mesmo que dizer que vai criar uma comissão para estudar o assunto. E já sabemos bem o resultado prático dessas comissões”.

Apelando à defesa da autonomia da associação entende o PSD Porto que “A ANMP não é de direita, nem de esquerda, não pode, nem deve estar ao serviço de um Governo ou de um partido, porque ela representa, na sua essência, todos os autarcas, sem exceção”.

No mesmo comunicado é criticada a decisão do Governo que “ao executar os procedimentos e no âmbito da legislação sectorial da descentralização, não ouviu os municípios, privilegiou transferência de “tarefas” em vez de delegar “competências” e subavaliou o correspondente envelope financeiro”.

As consequências desta decisão são claras para os subscritores deste comunicado:  “O Governo vai deixar de ter um encargo, que antes cativou e agora transferiu para os municípios, e bem sabe que as verbas calculadas, por insuficientes, darão origem a uma de duas situações: ou os municípios assumem um acréscimo de despesa que devia ser assumida pelo Governo, com prejuízo das suas próprias competências legais; ou então, os municípios, para assegurar o desempenho das competências delegadas, que cabiam ao Governo, endividam-se ou deterioram a qualidade do serviço. Em qualquer caso, no fim, quem acabará por pagar de forma direta serão os munícipes”…

Por esse motivo, defende o PSD que “o Governo deverá suspender, de imediato, o processo de Descentralização, renegociar os prazos, mas sobretudo o pacote financeiro a transferir município a município porque, naturalmente e como sempre defendemos, a transferência de competências, não pode nem deve ser universal – as realidades económicas e sociais são diferentes na escala e específicas em cada território – e só depois proceder à delegação de competências”.

Luísa Salgueiro ainda confiante

Recorde-se que a 5 de Abril a presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) defendeu que a descentralização de competências está em “marcha acelerada” tendo-se mostrado confiante em “soluções de consenso” com o Governo quanto à transferência de verbas para as autarquias.

As consequências desta “marcha acelerada” para já são contraditórias e permitem antever a complexa discussão que se seguirá quando o assunto da “descentralização” se transformar na questão de decidir o processo de “regionalização”. Nessa altura serão visíveis tensões mais profundas.

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Fotos: ANMP (reunião) e www.porto.pt, Portal de Notícias do Porto.